domingo, 4 de janeiro de 2015

Deus continua morto

     Um dos piores filmes já feitos. Podia parar aqui, com essa única frase. Lixo ao cubo, resume bem! O filme é patético, mal produzido, previsível, ridículo em todos os aspectos. Tanto os personagens como os atores são horríveis (tipo Malhação, saca? Atores novatos em teste e veteranos que não têm mais espaço). [Aviso que o texto tem spoiler]. São inúmeras estórias desconexas, mal contadas, mal elaboradas e mal finalizadas. Todas com o intuito descarado de propagar o cristianismo à força, sem trazer a complexidade esperada dos temas. Não merece se quer quaisquer resenhas críticas, porque isso já é dar moral demais para um filme tão mal feito, de quinta categoria. Nietzsche já aconselhava: “não basta, contudo, saber manejar bem uma boa espada; é preciso saber também a quem se fere! Muitas vezes há mais valentia em se abster e em passar adiante, a fim de se reservar para um inimigo mais digno. [...] por isso há muitos adiante dos quais deveis passar; sobretudo ante a canalha numerosa que vos apedreja os ouvidos, falando-vos do povo e das nações" (Assim falou Zaratustra. Das Antigas e Das Novas Tábuas, XXI). Sem dúvidas, esse filme não é um inimigo digno de críticas. Pensei duas vezes antes de escrever esse texto, quase desisti, mas, como ele está sendo muito falado e a capa dele é literalmente uma propaganda enganosa bem criativa, vamos ao comentário:

     A discussão filosófica sobre a questão, nem sequer é abordada de forma minimamente aceitável. Sou professor de Filosofia, fiz o meu TCC, no Departamento de Filosofia da UFMG, sobre a existência de deus. Para começar a conversa, deve-se aclarar e definir bem o conceito “deus” – um conceito que vai desde forças da natureza e animais até definições mais amplas e sofisticadas, como o Deísmo, o Panteísmo, o Deus cartesiano (a princípio, tão somente criador da Res Cogitans, "Coisa Pensante"), entre outros –, depois questionar se tal Ser é necessário para explicar o que experimentamos. Essas são as boas e necessárias questões para começar a trabalhar esse tema.

     Todas as citações usadas no filme são tiradas do seu respectivo contexto e/ou tema, não dizem absolutamente nada. A famosa frase de Nietzsche, "Deus está morto", não é um decreto do filósofo alemão; ele não estava matando deus na ocasião. Trata-se de uma análise da sociedade, feita pelo personagem Zaratustra, onde ninguém mais coloca deus presente para resolver seus problemas, isto é, ele não é mais invocado de fato na política, no comércio, nas trocas, na justiça, nas guerras, nas relações humanas, etc.; ele fora "isolado no céu", é isso que significa tal, o “deus antigo está morto”, uma constatação. A sociedade moderna "matou" deus, usa o nome dele da boca para fora. Outra: “se deus não existe, tudo é permitido”, a ideia está na obra de Dostoievski, “Os Irmãos Karamazov”, na memorável conversa que Ivan tem com seu irmão, Aliócha, no bar, mas exatamente essa frase pronta não existe – erro cometido em vários outros lugares, não é novidade do péssimo filme, não o crucificarei por isso. Tudo ser permitido não significa que vamos fazer tudo. Nossas ações têm consequências. Trivial. Agora, é interessante ficarmos presos a conceitos e regras ultrapassados para dizer o que é moral, supostamente "justificados" por deus? A sociedade evolui. (Vale lembrar que a Bíblia defende a escravidão - Lv 25: 44 -, genocídio, aquisição de meninas como escravas sexuais - Nm 31: 17,18 -, execução de homossexuais - Lv 20: 13 -, de adúlteros - Lv 20: 10 -, de quem não guardava o sábado - Ex 35: 2 -, de quem adorava outros deuses - Dt 13: 1-5 - e muitas outras atrocidades). Mas, enfim, não cabe aqui adentrar seriamente na discussão moral, que é apresentada de forma tão simplória e caricatural pelo filme.

     Quando o Stephen Hawking afirma que “a Filosofia está morta”, ele estava dizendo o que inúmeros filósofos já haviam dito séculos antes, pois Filosofia aqui está sendo tomada como Metafísica (do grego: além da física/natureza), isto é, querer versar sobre a verdade última das coisas, sem fundamentos sólidos. Hume já havia detonado toda afirmação desse tipo; Kant demonstra cabalmente como elas não podem ser sustentadas; Nietzsche e Wittgenstein dão as últimas facadas na, já morta, Metafísica. Um bom cético acrescentaria à frase do Hawking: “a Física também, ambas jamais podem nos revelar a realidade em si”. A filosofia demonstra como é ingênuo qualquer físico que pensa captar a Verdade com sua ciência; Merleau-Ponty nos apresenta isso muito bem: "O sábio de hoje já não tem, como o sábio do período clássico, a ilusão de aceder ao coração das coisas, ao próprio objeto. [...] Neste ponto, a física da relatividade confirma que a objetividade absoluta e derradeira é um sonho, ao mostrar-nos cada observação estritamente ligada à posição do observador, inseparável da sua situação, e rejeitando a ideia de um observador absoluto. Não podemos gabar-nos, na ciência, de chegar, pelo exercício de uma inteligência pura e não situada, a um objeto puro de todo o traço humano, tal como Deus o veria. Isto nada tira à necessidade da investigação científica; apenas combate o dogmatismo de uma ciência que se tomaria por saber absoluto e total. Isto faz simplesmente justiça a todos os elementos da experiência humana e, em particular, à nossa percepção sensível." (Palestras. I, § 5). Não há dúvidas que, no sentido mais amplo, a Filosofia não está morta, pois, a própria crítica à filosofia, já é filosofia. Hawking diz tal pensando em termos científicos práticos, mas quando ele quer chegar ao “Princípio de tudo”, tomando como base o que nós humanos observamos, isto é, como o mundo se apresenta a nós, mostra o seu teor pueril metafísico, mesmo que regrado por cálculos matemáticos. Kant diz: “Em contrapartida, a representação de um corpo na intuição nada contém que possa pertencer a um objeto em si; é somente o fenômeno de alguma coisa e a maneira segundo a qual somos por ela afetados; e essa receptividade da nossa capacidade de conhecimento denomina-se sensibilidade e será sempre totalmente distinta do conhecimento do objeto em si mesmo, mesmo que se pudesse penetrar até ao fundo do próprio fenômeno”. (Crítica da Razão Pura – Estética transcendental, A 44). E, ademais, a Filosofia está em todos os campos humanos, muito além da crítica à ciência, está também na Lógica, na Ética, na Estética, na Teoria do Conhecimento, na Teoria Política, é muito improvável que uma mente brilhante como a de Stephen Hawking não reconhecesse tal valor.

     Quanto a afirmar que algo pode surgir do nada, é indemonstrável e, até segunda ordem, uma contradição lógica, dentro do nosso "jogo de linguagem", parafraseando Wittgenstein. Os gregos antigos sempre afirmaram que "nada surge do nada", o que eu concordo, a julgar pelo que experimentamos (mas isso não implica na existência de deus). Não conheço o texto em que Hawking afirma tal, mas, se o faz, dá um passo metafísico, insustentável; qualquer idiota pode refutar, como o filme diz, até o John Lennox foi capaz. A propósito, Carnap, na sua “Superação da metafísica por meio da análise lógica da linguagem”, mostra como “o Nada” é uma extrapolação do jogo linguístico (com intenção de atacar Heidegger); propriamente dito, não existe “o Nada”, tal expressão não é passível de substancialização, é apenas uma falta. Filosoficamente falando, não há a necessidade de algo ter sido de fato criado, todo o mundo aparente (onde vemos mudanças, nascimento e morte) pode ser só isso, aparência, ilusões da minha mente, assim como num sonho, onde, p. ex., sonho com uma cidade inteira que nunca existiu; mas alguém poderia objetar que mesmo a ilusão teve um início, sim, teria razão, mas isso não implica substância, quer dizer, não implica que exista de fato, fora de mim. Pode tudo ser um comigo (solipsismo). E, ao contrário do que Descartes alega no “Meditações sobre a Filosofia Primeira”, não é necessário um criador do Eu, do ser pensante; é possível, não necessário – não vou entrar aqui nos detalhes, para quem tiver interesse, ver a refutação de Kant a Descartes na "Crítica da Razão Pura" (B399 – B413); tenho um vídeo no YouTube onde trato da questão: “CRESÇA 9: Afinal, Deus existe ou não existe?”, mas, para se aprofundar mesmo, você vai ter que ler. O único ponto que se salva é quando o Josh (nome bíblico, Josué, em português, que significa "Deus é salvação"; bem sutil, hein?! rs) fala que o nome e o status de alguém não faz com que as afirmações do mesmo sejam verdadeiras. Afinal, sem mais argumentos, isso é a clássica falácia argumentum ad verecundiam, "apelo à autoridade".

     O criador de tamanha merda de filme não conhece minimamente o que diz a Teoria do Big Bang, pois, nela, nada fora criado, ao contrário do que o aluno idiota alega no filme (e o professor, mais idiota ainda, fica calado ao escutar), tudo sempre existiu comprimido em um único ponto, a "Singularidade"; com a explosão, houve apenas a expansão da matéria/massa já essencialmente existente. Isso é o básico do básico da Teoria do Big Bang! Então, é uma questão em aberto o que motivou de fato a explosão/expansão inicial, mas, pode ser qualquer coisa: átomos autônomos, algo externo ao Universo ou o próprio Universo, Multiverso e efeito de outras dimensões, a Esfera de Parmênides, hipóteses semelhantes à Matrix (cérebro na cuba), inclusive, tudo pode ser apenas fruto da nossa mente e, claro, como pode ser tudo: deuses, deusas e o que mais pudermos imaginar. Ora, mas nada temos para afirmarmos se tratar dos últimos. Só temos a dúvida, o ponto de interrogação, tal não pode ser preenchido com o “Deus das lacunas”! É muito conforto responder “foi deus” para tudo o que não sabemos, mas não passa de uma resposta infantil, do tipo “sei porque sei”. O personagem principal do filme usa essa mesma falácia para responder a dúvida que existe sobre o boom de espécies no Período Cambriano, tão somente a dúvida é suficiente para o rapaz afirmar que foi fruto da palavra mágica de deus! Tem que avisar para ele que, depois de Darwin – aquele que disse que a “evolução não dá saltos” –, já houve muitos avanços na Teoria da Evolução e, com a ciência genética, temos nos surpreendido a cada dia, muitas coisas curiosas sobre interação genética nas espécies têm alargado o conceito de evolução biológica, inclusive, já temos teorias bem plausíveis para a explosão cambriana. Mas, enfim, o garoto estúpido usa apenas a dúvida para defender que seu deus fez tal como feitiçaria, como uma fada encantada sacudindo sua varinha por aí. Tese firmada em que? Na experiência? Em dados robustos? Em evidências? Alguém, ao menos, já disse ver um animal qualquer surgir do nada? Não. Base: tão somente um texto antigo e suas fábulas. A piada é pronta! A dúvida pode gerar hipóteses, não certezas. O ponto é claro, qual seja: poder ser, não implica ser, de fato, o caso. Óbvio!

     Sobre o argumento do “Design inteligente”, eu escrevi um longo texto criticando um dos mais badalados pregadores (a palavra é essa mesmo, "pregador", midiático e fundamentalista) dessa tese no Brasil, Marcos Eberlin. Em suma, apela para a emoção, é carregado de antropomorfismo, metafísica barata e ingenuidade; mas ainda que fosse o caso, a partir de tal, não há qualquer passo para a veracidade do deus cristão, ou qualquer outro mito, semelhante ou não. [Para ver em detalhes como isso é uma bobagem, nada como ler o clássico "Diálogos sobre a religião natural", de Hume].

     O garoto alega que o livro de Gênesis (onde se encontra a contraditória criação do mundo: a Terra e os vegetais criados antes do Sol, assim como o dia e a luz terrena "independentes" do último, a Lua e o Sol no mesmo patamar de "luminares", numa narrativa disparatada do começo ao fim - Gn 1: 1-18 -, entre outros vários absurdos: a mulher criada junto com o homem e depois outra vez, da costela dele - Gn 1: 27 e 2: 22 -, já nascem dotados de linguagem complexa, assim como a cobra, rs - Gn 3 -, em poucos tempo dominam o fogo, constroem sozinhos casas, criam a agricultura; Caim, primogênito de Adão, encontra do nada uma esposa em um outro lugar - Gn 4: 16-17 -, idades mirabolantes das pessoas e por aí vai) – vale lembrar que a maioria dos teólogos de hoje não defendem a literalidade de tal – já falava a verdade que a ciência só foi descobrir 2.500 anos depois. Primeiro, a ciência não é uma verdade absoluta para compararmos com qualquer possível "veracidade" coincidente das crenças mitológicas, é tão somente as melhores teorias que temos, o melhor e mais simples para nos guiarmos no mundo (filósofos da ciência como K. Popper, T. Kuhn, I. Lakatos, P. Feyerabend, A. Chalmer e outros, mostram isso à exaustão). Mas é "ciência" da coisa conforme nos aparece, limitada, de cara, pelos sentidos; não da "Coisa em si" (Kant). [Tenho um outro vídeo, sobre essa questão da validade científica, para quem tiver interesse: "CRESÇA 10: Ciência, limitada, mas aplicável"]. É tão efêmero que, mesmo o aumento da capacidade de observação pela tecnologia, pode mostrar que estávamos errados. É assim que a ciência tem sido, não conhecemos nem mesmo o que nos aparece. Em uma palavra: a Teoria do Big Bang, hoje corroborada pela nossa capacidade de observação e pesquisa, pode vir a ser falsificada no futuro – a ciência não chega à Verdade, estamos limitados à condição humana, como já dito acima. Ora, dessa forma, como alegar então que a Bíblia ou qualquer livro sagrado está certo sobre o Cosmos por ter alguma coisa em comum com a (restrita) ciência atual? Diga-se de passagem que, a Bíblia diz que a Terra tem por volta de 6 mil anos! Nada mais grotescamente absurdo ao que podemos observar! (Estimula-se que a Terra tem por volta de 4,5 bilhões de anos). O que James Hutton passou por questionar a irrisória idade da Terra, proposta pelos cristãos, não está no gibi! [A propósito, o cômico mito de Gênesis, na parte em que deus disse “Haja luz”, ao contrário do que o filme propõe, não tem absolutamente nada a ver com a Teoria do Big Bang, é uma interpretação que extrapola o texto de forma absurda, por evidente conveniência. A luz em tal mito se refere ao dia, contrapondo à noite. Ora, o próprio texto fabuloso diz que antes do "haja luz" deus criou a Terra e inclusive andava sobre a "face das águas" (Gn 1: 1-2)! Terra e água antes do Big Bang?! O(s) ignorante(s) da Era do Bronze que criou(criaram) esse mito, jamais imaginou(imaginaram) qualquer coisa parecida com a Expansão Universal – e, vale lembrar que, segundo a ciência atual, a luz não foi “criada”, mas sempre esteve compactada na Singularidade, pois, na teoria einsteiniana, massa se converte em energia e vice-versa: o famoso E = mc². O que não se tem uma teoria paradigmática é sobre o que provocou a expansão/explosão inicial. Isso está em aberto e, novamente, a nossa ignorância não prova deus. Ignorância não é argumento válido para crer em algo. Friso: "haja luz", nem remotamente, alude ao Big Bang!].

     O Agnosticismo é "abordado" em segundos, como se fosse uma posição boba e ingênua. Que piada! Refutar um ateu categórico, como o professor do filme, isto é, que afirma em absoluto a não-existência de qualquer deus, é a coisa mais simples do mundo, pois é impossível provar inexistências (sim, sem restrições prévias, é impossível provar a inexistência até do Bob Esponja! O que garante que ele, ou coisa que o valha, não existe de fato em um planeta distante ou em outra dimensão? Nada. Tudo que sei é que a estória dele foi inventada aqui na Terra, numa data determinada, mas isso não impede de, coincidentemente, haver tal ser em algum lugar ou realidade paralela, o que não temos é motivos para levar tal hipótese a sério, antes, pelo contrário, mas é logicamente possível, como qualquer outra questão de fato a priori). É tão simples mostrar a falta de fundamento para a afirmação categórica da inexistência de qualquer deus, como mostrar tal para a afirmação correspondente feita para a existência de tais. Além de ruim (os sites The Guardian, Variety e o Adoro Cinema deram, acertadamente, nota 1 em 5), o filme é tiro no pé atrás de tiro no pé, alguns dos filósofos mostrados no quadro que o professor apresenta no início não são ateus, propriamente ditos: não acreditar em deus não implica afirmar cabalmente a inexistência de tal. A posição cética/agnóstica não permite tais passos metafísicos. Não há como provar que Jesus não é deus, assim como não há como provar que Zeus não o é. Hume já dizia que a princípio tudo pode ser tudo, só não temos razões para acreditar em tais, já que nosso melhor guia é a experiência e as questões de fato, através delas, não temos subsídios para levar em consideração tais deuses/hipóteses (sim, mesmo podendo até afirmar que são fracas, não deixam de ser hipóteses, mas são só isso, o fato de não conhecemos a realidade em si, obviamente, não é suficiente para lhes darmos qualquer crédito). O agnóstico é alguém que reconhece a incapacidade humana para resolver essas questões, é por isso que suspende o juízo, não por estar "em cima do muro", com medo ou receio de escolher.

     Ligar a não-crença no patético (sobretudo, com o sentido grego, oriundo da palavra pathos) Deus cristão aos sofrimentos pessoais foi o cúmulo! Só perdeu mesmo para todo mundo convertendo no final! É brincadeira! A opinião daquele crente mais imbecil e cavernoso que se pode imaginar é trabalhada no filme: querem passar a imagem que alguém se torna ateu, ou não-crente em deus, por ter sofrido muito. É tão absurdo que nem sei por onde começar a criticar esse disparate. Bom, o mundo está repleto de horrores e, se fosse necessário tal para descrer do insustentável deus cristão, não seria preciso vivenciá-los, bastaria olhar ao redor: crianças passando fome, sendo estupradas, torturadas, assassinadas, violentadas de todas as maneiras possíveis, por aqueles que deveriam as proteger; precisa de algo mais (como, no filme, a morte da mãe do professor)? Fala sério! Dito isso, crer no deus cristão é, no mínimo, imprudência, é acreditar em algo que vai contra as evidências (essas não nos dão a Verdade, mas é o melhor que temos para termos práticos), que se contradiz o tempo todo, que não é falsificável, que não tem bases ou implicações confiáveis, em uma palavra, é irracional (salvo para "epifânicos", que dizem ver e conversar com deus, e afins) – entenda-se por racional a melhor escolha, tomando como base os dados que temos e compartilhamos. A maioria das pessoas acreditam em deus sem refletir seriamente porque, muito menos por terem inquestionáveis experiências, para elas mesmas, quiçá para os outros. Acreditam por "fé". Que é o mesmo que abrir campo para se acreditar em qualquer coisa. Fé não é virtude, é ingenuidade – como disse o Matt Dillahunty (The Atheist Experience - 13/02/2011). Crer sem mais é dar crédito para qualquer absurdo.

     O argumento do C. S. Lewis para explicar o mal do mundo, em suma, é o “Livre-arbítrio”; segundo o mesmo, o mal não é a vontade de deus, mas consequência dos nossos atos. [Tenho um vídeo refutando o argumento dele: “CRESÇA 12: Moral, Ética Cristã e o Estado justo”]. O autor é citado no filme, mas, é claro, não levam em consideração àqueles males que não são consequências dos nossos atos (não podem ser consequências indiretas, já que, para Lewis, deus não castiga. Isso seria ninharia e mesquinhez, incompatíveis com a natureza divina que, para ele, é "perfeita"), como tsunamis, terremotos, tornados, explosões vulcânicas, pessoas atingidas por raios, meteoritos, defeitos biológicos e todos os outros males causados pela natureza. Se deus é bom, todo-poderoso e impreterivelmente tem autoridade sobre a natureza, como explicar tais males? (E que males!).

     O estrume de filme – ou melhor, nem estrume é, porque estrume serve para alguma coisa, como fertilizante –, termina com a imbecilizante conversão do professor de Filosofia (que é colocado como um monstro cruel antiético durante toda a fraca trama, como se fosse impossível agir moralmente sem deus; desconsideram que o agir moral é um ganho para todos numa vida em sociedade. E na cadeia só tem ateus, né?! Só que não!), o cara é atropelado por um carro e nos momentos finais, em meio ao medo extremo, confessa Jesus Cristo como seu salvador (acredite, se você deixar de assistir esse filme pelo spoiler, vai me agradecer); deus enviou um pastor para livrar a alma dele do Inferno, máquina de tortura eterna que ele mesmo criou, para jogar descrentes e etc.! rs. Como disse Bertrand Russell, isso é uma mentira das mais covardes que vem sendo usada por religiosos, poucos descrentes convictos se convertem a uma divindade na hora da morte, até porque, ao contrário do que prega a famosa “aposta de Pascal”, escolher o deus cristão para ao menos se livrar do Inferno, se agarrando no argumento de que não há nada a perder, é insustentável, pois, escolher um deus em específico é negar os outros milhares que podem existir; não faz sentido. E, como Rubem Alves diz no livro “O que é religião?”, esses que se convertem e/ou clamam deus na eminencia de morte, na verdade não acreditam de fato, querem é continuar a vida a qualquer preço – caso clássico: num avião em queda, os “crentes”, ao invés de ficarem felizes por estar indo de encontro ao seu deus de "amor", clamam para serem salvos; contradição é mato! Ainda citando Rubem Alves, já que estamos tratando desse tema, vale deixar aqui uma frase pertinente dele, para refletirmos, que inclusive fez parte da sua experiência em abandonar a igreja: "um deus que cria um lugar de tortura eterna, não é digno do meu respeito, o que dirá, do meu amor!".

     Para finalizar, não se prova a existência de deus, não se prova a sua inexistência, mas não há porque crer em algo sem mais, sobretudo, no que contraria os fatos. O filme Deus não está morto, em todos os sentidos, é para se colocar no lixo, mesmo para você, que é cristão! Caso contrário, vai passar vergonha reverberando "argumentos" tão fracos, autorefutáveis, ridículos e natimortos.

2 comentários:

  1. O "argumento" de qualquer pessoa de fé é usar artifícios emocionais pra mostrar a existência do deus cristão.
    É hilariante. :-D

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  2. Não discordo. Na época do lançamento eu frequentava uma igreja, e, ainda assim, achei uma tremenda sacanagem a interpretação com a qual trataram a frase "Deus está morto". É bem óbvio, visto que qualquer um que senta vinte minutos e tenta entender o que Nietzsche queria dizer com a frase, que o filme é todo ele baseado numa interpretação totalmente ao pé dá letra. Bom, mas estamos falando de figuras que querem entender tudo de forma rápida, é que não tem em si o mínimo propósito de tentar entender a luz o que as coisas realmente são.

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